terça-feira, 13 de março de 2012

Conceito de parentalidade, será realmente aquilo que fazemos dele?

A palavra “família” não é fixa, é polivalente; vai mudando constantemente ao longo das gerações variando de indivíduo para indivíduo estando sempre sujeitas a futuras alterações e evoluções de acordo com a época em que vivemos.
As famílias de há cinquenta anos atrás eram bastante diferentes das actuais. Ao pai sempre lhe foi atribuído um papel de “chefe de família” onde era este que tomava sempre a decisão final, era um símbolo de poder e autoritarismo. Era este que tinha o dever sustentar a família, trabalhando, enquantoque a mulher, submissa às suas decisões, ficava encarregue de outras tarefas. A função da mãe era de educadora dos filhos, esta tinha como objectivo evitar o abandono e a morte das crianças, cuidando das mesmas. Tinha acima de tudo uma função reprodutora e era o centro de gravidade da família dada a ausência da figura paternal.
As famílias eram, por norma, numerosas onde o filho mais velho era sempre privilegiado. O primogénito sempre foi o “eleito”- até nos dias que correm, em países monárquicos, o primeiro filho dos reis é o que será coroado como futuro rei.
As filhas tinham uma relação de “simbiose” com a mãe; esta ensinava-as a realizarem todo o tipo de actividades (cozinhar, limpar, coser, etc.) pois era esse o seu futuro também. A filha ou as filhas mais velhas faziam também o papel de mãe dos irmãos mais novos, cuidavam destes desde muito cedo, ajudando a mãe, estando a seu cargo imensa responsabilidade.
As famílias eram quase todas muito numerosas dada a escassez de informação e de contraceptivos disponíveis. As mulheres estavam constantemente grávidas, acabando por servir como contracepção natural. Cabia ao pai, figura de poder, reduzir/limitar o número de nascimentos.
Com o passar dos anos, foram surgindo então as famílias contemporâneas onde houve grandes revoluções na educação e costumes. Primeiramente, as mulheres começam a trabalhar fora de casa tal como os homens. As mulheres começam a ter menos tempo para ser mães a tempo inteiro e apostam na sua formação profissional e na sua autonomia, tal como os homens. Há então uma grande quebra de nascimentos. O novo baby boom deste século depara-se com a procriação assistida onde, surgem novos métodos de engravidar; mulheres inférteis podem agora ter filhos (e normalmente esses tratamentos estimulam a geração de mais do que uma só criança). Há também um número bastante inferior de mortes no parto, o que faz fomentar a natalidade. Há então alguns prós e contras q tanto beneficiam a natalidade como a prejudicam.
A mãe e o pai começam então a ter tarefas duplas. A mãe tem de conciliar as suas actividades, com o papel de mãe e o emprego. Tudo isto contribui para que o pai comece a estar mais presente na vida dos seus filhos, as tarefas são, então, mais distribuídas e não catalogadas como sendo só para a mãe ou só para o pai.
O divórcio também é um tema que deixa de ser tabu para ser visto como uma realidade frequente em muitos conjugues. Este acontecimento é mais um contributo para se dar uma aproximação no papel dos pais. Consequentemente, vai haver um crescimento das famílias monoparentais .
A questão da pluriparentalidade, que sempre existiu de diversas formas (tios, avós, amas, vizinhos, irmão mais velho, etc.) vai-se acentuar neste período devido à ocupação e falta de tempo dos pais.
Neste baby boom surge também o “fantasma da criança perfeita” onde o excessivo planeamento e ideais colocados na futura criança vão ser prejudiciais para a natalidade pois o número de nascimentos vai reduzir dado todos os tópicos necessários para se iniciar uma gravidez. A ecografia, a amniocentese, bem como a correcção de anomalias genéticas contribui para q os pais possam controlar tudo o q poderem acerca do q o futuro bebé se tornará.
A parentalidade nada tem a ver com um elo biológico. Não tem de ser necessariamente uma relação entre os pais e os filhos, mas sim a relação de um casal com a criança. As figuras parentais de uma criança são aquelas a que esta tem mais afecto, carinho, respeito e confiança; são aquelas pessoas que cuidam, educam e envolvem a criança num clima de amor e compreensão. É um conceito que nos permite construir laços sociais . Existem crianças que vivem com os seus pais biológicos mas não existe uma parentalidade entre eles. A comunicação entre estes pode simplesmente não existir, esse clima não proporciona uma relação de parentalidade entre os pais e os próprios filhos.
Muitas pessoas confundem conjugalidade, que é a relação entre os conjugues (casal) com parentalidade, que, como já vimos, nada tem de semelhante. A conjugalidade é para sempre pois, independentemente do que suceder à relação pais vs filho, estes irão ser sempre pais biológicos da criança. A figura parental masculina e/ou feminina não tem de ser obrigatoriamente pai e mãe.
A própria palavra, “Parentalidade”, não consta em dicionários de língua portuguesa, é um neologismo, é uma organização teórica.
A parentalidade ultrapassa masculino vs feminino, mãe vs pai; ou seja, já não é necessária uma relação de conjugalidade para poder haver parentalidade. As novas técnicas de procriação assistida (barrigas de aluguer , por exemplo). As mulheres começam a entrar em espaços e universos masculinos onde por vezes, não há espaço para uma relação entre um casal.
Passamos de uma geração pivot para a Geração Sandwich onde a desigualdade de géneros parece ter sofrido uma grande alteração, tendo diminuindo drasticamente. Havia um afastamento considerável da figura masculina mas isso tem vindo a ser alterado .
Com o divórcio a ser cada vez mais uma coisa normal, vão surgir novas possíveis figuras parentais na nossa sociedade que não se sabe, devido à sua precocidade, que futuramente poderão vir a ser bons modelos de parentalidade. Ainda não está estudada a relação entre crianças e madrastas/padrastos, haverá então uma difusão de parentalidade.
Na minha opinião todos podem exercer uma relação de parentalidade com a criança, independentemente das circunstâncias, os laços criados não têm de ser exclusivos de uma específica identidade. O que realmente interessa é a atmosfera à qual a criança está sujeita, pois isso irá determinar a sua visão relativamente à vida futura.
Agora pensemos, quem somos nós para nos opor ou destruir uma relação de parentalidade que muitas vezes é evidente?

5 comentários:

Anónimo disse...

Creio que nem sempre a «relação de parentalidade» deve ser legalmente permitida. Dou um exemplo, um jovem de 25 anos (por exemplo) pode ser o tutor de uma criança com 10 anos. Esta última pode adorar o seu tutor, e esta relação pode muito bem ser mútua. Mas o jovem poderá estar ausente grande parte do tempo, ter companhias pouco recomendáveis, ou até consumir drogas... (é uma hipótese, varia obviamente de caso para caso). Ora, apesar da possível boa relação entre os dois, o ambiente não será o mais adequado à criança, mesmo que ela discorde, pois ainda não tem idade suficiente para saber o que é melhor para si.
Na minha opinião, é preferível, nestes casos, entregar a criança a uma ou mais pessoas responsáveis, conscientes e ativas, mesmo que não possuam empatia com a criança. Com o tempo, se a criança for tratada corretamente, criar-se-á inevitavelmente uma nova «relação de parentalidade», desta vez positiva.

Carlota disse...

Considero que este texto trata um tema muito interessante,está muito bem estruturado, e muito bem explicado tambem. Faz uma boa comparação entre o antes e o depois, e com esta comparação conseguimos perceber como a sociedade evoluiu, tanto os homens, como as mulheres.
Na minha opinião verifica-se uma grande mudança com uma evolução muito positiva. Pois não só os pais estão mais presentes na vida das crianças (o pai principalmente, pois antigamente estava mais distante) como a familia mais proxima, como os avós e os tios...
Alguns pontos negativos são, como a Inês referiu, o "fantasma da criança perfeita" onde as crianças normalmente são muito pressionadas e isso pode ter conequências muito graves. Outro dos pontos negativos é o facto de actualmente o divórcio ter sido banalizado.
Em suma, é um tema que tem muito que falar e acho que a minha colega conseguiu resumidamente "pegar" nos pontos fundamentais tendo dito o essencial.

Inês Rosa disse...

Aceito na totalidade ambas as criticas feitas. Quero, no entanto, responder especificamente ao Bruno...
Será realmente que uma criança com 10 anos não dispõe de idade suficiente para distinguir uma boa atmosfera retratada através do carinho e afecto de uma má atmosfera retratada através do abandono? Penso que desde que se seja ser humano se sabe distinguir tal coisa.
Em suma, não concordo com a ideia de ''não tem idade suficiente para saber o que é melhor para si. '', claro há casos e casos mas não pensemos nisto particularmente mas sim de uma maneira mais geral...
Tu, quando tinhas 10 anos, não sabias distinguir o bom e o mau?

Anónimo disse...

Inês,
No meu exemplo disse que a relação entre ambos pode ser muito boa do ponto de vista afetivo. No entanto, do ponto de vista do futuro da criança, essa relação pode não ser tão boa. Tratando-se de uma criança com 10 anos, não se pode esperar que compreenda o melhor para o seu futuro, nomeadamente o universitário/profissional, dado que só diz respeito a idades a partir dos 18 anos. Quando eu tinha 10 anos, só sabia que uma universidade servia para «aranjar trabalho», e se os meus pais me tivessem ensinado que tomar drogas é bom e andar na universidade é mau, eu também teria acreditado.
Quando se ama a pessoa que toma conta de nós, não sabemos se o que ela faz é bom para nós ou não (exceto casos óbvios, como violência, etc.).
Mesmo uma boa atmosfera pode proporcionar um percurso negativo no futuro. Nem tudo o que brilha é ouro.
Quando eu tinha 10 anos, a minha noção de «bom» era completamente diferente da que possuo hoje.

Claro que falei apenas de um caso possível. Tentei alertar para um possível problema do teu discurso, que apesar disso está sem dúvida muito bem estruturado, coerente, com princípio, meio, e fim. É bom termos opiniões para as podermos expor e defender.

Espero uma tua resposta...

João Simas disse...

Põem-se aqui múltiplas questões. O conceito de família tem mudado ao longo dos tempos e nunca foi unívoco. Há progressos e regressos nestas questões. Repare-se que, por exemplo, durante a República o divórcio passou a ser legal, mas fortemente restringido durante o Estado Novo que impôs uma moral mais conservadora, um conceito único de família, patriarcal mas que, em contradição, levou a que as pessoas emigrassem em massa destruindo-se por isso muitas unidades familiares.
Mesmo nas famílias tradicionais camponesas havia diferenças, algumas com um papel fundamental da mulher, explicavel só em parte pela longa tradição de emigração.
Os direitos das mulheres só se põem como problema (antes havia os factos mas as pessoas admitiam a sua "naturalidade"), a partir das sociedades industriais e contemporâneas, com o trabalho assalariado ou independente e os progressos no conhecimento da contracepção, alterando totalmente as conceções do papel dos géneros e a noção de família, fruto também de muitas reivindicações e lutas pelos direitos políticos democráticos, sociais e culturais. A questão da adoção não é nada simples mas, por exemplo, há ainda uma opção legal que não tem sido quase utilizada: o apadrinhamento civil. Nesta figura jurídica a criança não deixa de ter relação com os progenitores, mas a educação da criança fica sob a responsbilidade do padrinho, que tem também direitos a nível fiscal e outros.