Desde há uns tempos a esta parte, tenho vindo a constatar que existe uma certa mentalidade ultra-conservadora e até mesmo retrógrada que está a aumentar na nossa sociedade. Frases como "Volta, Salazar volta!", "os gays são pessoas doentes" são cada vez mais ouvidas. Recentemente, o novo cardeal português D. Manuel Monteiro de Castro, afirmou o seguinte: "...cabe à mulher educar os filhos e por isso devem ficar mais tempo em casa...".
Ser conservador é tão legítimo como ser sportinguista e, gostemos ou não, e apesar de não ser tão comum como ser benfiquista é uma forma de estar na vida bastante natural. Mas não é sobre conservadorismo que pretendo falar, mas sobre o facto de se possuir um pensamento retrógrado
Os portugueses, alguns, têm memória seletiva: lembram-se muito bem dos Descobrimentos, mas não se lembram das condições de vida que existiam há 50 anos atrás, nem das taxas de emigração. Talvez fruto desse esquecimento tenham eleito conscientemente Salazar como O Grande Português, não se importando de gastar 60 cêntimos+IVA, quando, certamente, 30 anos antes tinham celebrado a queda do regime a que este senhor tinha presidido. Numa fase mais recente, ouve-se, não só em cafés, mas também em lugares mais eruditos, exclamações épico-dramáticas demonstrativas de um sebastianismo desesperado, apelando a um regresso utópico (ou bem real), não de António de Oliveira Salazar, mas de um "salazar", como se um ditador, por ser ditador, possa ser mais eficaz que um democrata, por ser democrata. Para meu espanto, estas frases são ainda aplaudidas por quem as ouve como se de algo bom se tratasse, como se tivesse alguma piada.
Felizmente, para escrever este texto não tive dificuldades em encontrar exemplos. O mais recente é o do Cardeal D. Manuel Monteiro de Castro que, se não estou em erro, recebeu o título de Cardeal há pouquíssimo tempo. Na sua opinião, "...cabe à mulher educar os filhos e por isso devem ficar mais tempo em casa...". Ora esta frase seria perfeitamente natural há 38 anos atrás ou há 100 anos atrás, mas hoje não! A Declaração Universal dos Direitos do Homem consagra o direito à não-discriminação com base no género e o que Cardeal fez foi simplesmente uma violação a este princípio. Independentemente da sua opinião pessoal, creio que as declarações feitas a título profissional devem ser cuidadas e recatadas, nomeadamente, quando se representa uma instituição centenária ou milenar como a Igreja Católica. Para além de difamatórias e discriminatórias, estas declarações demonstram o pensamento retrógrado da Igreja ou pelo menos de alguns dos seus representantes, que se mostram outras vezes desagradados com a perceção que a opinião pública tem sobre o seu trabalho, a sua missão e princípios.
Enquanto alguns falam de retrocessos civilizacionais (e com razão!) eu prefiro destacar os retrocessos mentais que estão a acontecer, sem que ninguém se lhes dê muita importância...
Hoje, mais do que nunca, devemos decidir de que forma queremos evoluir. Existem dois escolhas possíveis que podemos fazer: a do retrocesso mental, da mente fechada a novas ideias e do medo ou o caminho da abertura de espírito, da procura da igualdade e do desenvolvimento cultural e civilizacional. Eu já fiz a minha escolha! Peço-vos que façam a vossa.