quarta-feira, 18 de março de 2015

Não vamos matar Amália!


E se um dia Amália Rodrigues, a grande referência do povo lusitano, se perder nas brumas da memória de quem, outrora a engradeceu e lhe deu o mérito merecido?
E se um dia esse alguém deixar morrer o “filho” de Gil Vicente que, já hoje debilitado, luta dia após dia para não se deixar esquecer totalmente por quem o mata aos poucos?
E se um dia todas as marcas de um passado que nos fez quem somos hoje, forem destruídas e não formos mais “aquele” povo melancólico dos descobrimentos e das descobertas maravilhosas como o fado? É ao povo lusitano que me refiro. Esse que fez nascer as maiores obras de arte e hoje, se olharmos para a verdadeira cultura portuguesa, depressa chegamos à conclusão de que a mesma se encontra em ruínas e em risco de nunca mais ser devidamente recuperada.
A verdade é que com a adoção de novas culturas, novos costumes e até diferentes estilos de música e arte, os portugueses acabam por se afastar da cultura que os distingue. O que por vezes me faz temer que, num futuro próximo, as marcas daquilo que vivemos sejam para sempre perdidas.
Depois da tão grande luta de Gil Vicente para implantar o teatro em Portugal, Almeida Garrett teve, mais tarde, o cuidado de não o deixar ruir, de não deixar que os portugueses dele se esquecessem, quando percebeu que tal poderia vir a acontecer. Hoje, eu mesma, temo que ninguém mais tenha a capacidade e o poder de fazer com que os portugueses troquem um serão a ver filmes em casa por uma ida ao teatro com a família ou amigos. Já todos conhecemos a famosa desculpa de que “como estamos em tempos difíceis, tenho de poupar dinheiro!”, mas a verdade é que, muitas das vezes, acabam por gastá-lo num jantar caro, ou até mesmo numa noite na discoteca com os amigos.
Outra das coisas que, a mim, me dá que falar é sem dúvida o Kizomba. Não digo que não aprecie, que não goste de ouvir e de dançar ao ritmo de uma música africana. No entanto, desde há uns meses para cá, estamos a deixar-nos invadir por estilos totalmente diferentes daqueles que marcam a nossa história. Depressa o fado foi substituído por músicas crioulas, africanas e que não fazem de todo parte da nossa cultura. Como podemos apercebermo-nos de tudo isto, aceitar que passe em frente dos nossos olhos e ficarmos num conformismo puro, de braços cruzados, acabando por, muitas vezes forçosamente, nos adaptarmos a algo que não nos diz nada, só porque está na moda e porque é isso que nos habituamos a ouvir quando estamos junto dos nossos amigos? A verdade é que a cultura portuguesa se tem perdido com o passar do tempo e em vez de crescer e de ser própria, diminui na dependência daquelas que querem dominar o mundo.
Jovens de Hoje, não vamos matar Amália!

1 comentário:

João Simas disse...

Boa questão. Durante séculos houve uma oposição entre "castiços" e "estrangeirados". Seria só isso? Afinal as passagens por Africa, América, Índias etc. levou e trouxe muitas coisas. Mesmo o crioulo resulta do intercâmbio de culturas, nem sempre feliz para alguns. Mesmo Amália cantou fado da Mouraria, como poetas de várias origens, com músicas de várias origens. Aliás, o grande reconhecimento de Amália começou no Brasil. Provavelmente o que é fundamental é conhecer a nossa cultura, torná-la viva e isso é problema de todos.