sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Hoje em dia, os portugueses deparam-se com a dura realidade de uma crise económica grave, que de certo modo, os impede de investirem num futuro melhor do que o presente.
É, decerto, notável o grave esforço que é feito por muitas famílias e muitas das vezes, pelo próprio estudante, para que o mesmo possa ter acessibilidade ao ensino superior. Sendo assim, o trabalhador-estudante já virou uma marca do século XXI.
No entanto, a meu ver, esse esforço é desvalorizado quando os alunos, vitoriosos por conseguirem essa acessibilidade, passam a sentir-se quase na obrigação de se submeterem a uma tradição académica, que a muitos não diz nada, para que não se sintam deslocados do convívio académico.
É um facto de que a praxe é uma escolha de cada um, pois o estudante pode ou não ser praxado, conforme as suas escolhas. No entanto, se decide não o fazer é, de certo modo, penalizado com um diferente tratamento ao longo da sua vida académica.
A meu ver, e na opinião de muitos, as praxes não são de todo, a melhor forma de integração académica visto que, na maior parte das vezes, não fazem o estudante sentir-se bem e põem em rico a sua autoestima. Deveriam ser impostas regras mais rígidas que impedissem a humilhação naquilo que devia ser visto como uma brincadeira e uma celebração que integra o “caloiro” num novo mundo de vida profissional. Tal não é posto em prática de maneira nenhuma, pois são muitas as vezes que os reitores ameaçam punir as praxes, perante uma queixa abusiva, no entanto nunca nenhum reitor, de nenhuma universidade, teve coragem de o fazer. Em vez disso, deixam que os chamados “bichos” se submetam a respeitar os chamados “Senhores Estudantes”, só porque estes estão integrados na vida académica há mais tempo e por isso se consideram superiores, quando muitas das vezes, têm tanto conhecimento como um aluno acabado de se matricular.
Para tudo existem limites e a verdade é que quando os “Senhores estudantes” tomam posse de um número de caloiros, já sentem que têm em sua posse toda a cidade. A questão é que a restante população da cidade não se matriculou para o primeiro ano da universidade, nem aceitou submeter-se a praxe nenhuma. No entanto, é todos os dias, durante semanas ou meses, incomodada pela poluição sonora, ao longo de toda a noite e pela desagradável sensação de passar por um grupo de jovens na rua e ouvir dizer as maiores asneiras que alguém possa imaginar. Não podemos também esquecer a injustiça de que muitos cantores de rua são punidos e levados pelas autoridades por darem a conhecer a sua arte, enquanto que “as palavras feias” e o desrespeito em plena praça pública é ignorado pelas autoridades, sendo o mesmo considerado uma tradição académica.
A universidade deve ser vista como uma forma segura de mostrar ao jovem o caminho certo a tomar, de o orientar para a vida, de lhe dar a oportunidade de se tornar um bom profissional, que tomará o lugar dos maus profissionais que existem atualmente.
Como podemos ter bons profissionais dentro do nosso pais, quando o tempo em que para tal os podíamos estar a preparar, gastamo-lo com tradições académicas que, sobretudo nos últimos anos, têm causado tantos transtornos, preocupações e impactos negativos? Ouvimos histórias aqui e ali de estudantes que sofreram sérios danos, quando submetidos a uma praxe que, nunca pensaram ser o passaporte para um fim trágico. É verdade sim que essas histórias que tanto têm paralisado Portugal, têm acalmado os ânimos no que toca ao abuso com que esta tradição é posta em vigor. No entanto, Sejamos francos e honestos! Tal não acontece pela preocupação de que essas histórias se possam repetir e de que mais pessoas saiam magoadas pelo mesmo motivo mas sim pelo medo da punição, pelo medo de que a tão apreciada (para aqueles que praxam) tradição académica, seja punida de uma vez para sempre!
As propinas são pagas para que os alunos invistam no futuro. No entanto, as praxes e as exigências estipuladas para que a tradição se cumpra, originam um desencadear de problemas que põem em causa a aplicação e o investimento do aluno.

3 comentários:

Anónimo disse...

Não concordo contigo. Óbvio que há vezes em que os "Bichos" são humilhados pelos "Senhores Estudantes", "Digníssimos" e etc. Mas a meu ver as praxes não são apenas para humilhar. Se formos perguntar aos bichos caloiros eles vão-nos responder que queriam declarar-se anti-praxes mas que agora adoram. Temos que ter também em conta que não vemos o panorama total das praxes. O que nós vemos é apenas os gritos no meio da rua e eles todos sujos. Mas o que não vemos é quando eles estão em jantares de família, ou nas festas organizadas pelos cursos da universidade. Eu, pessoalmente, achava uma estupidez e repugnava-me a ideia de ser humilhada por pessoas que não são mais que eu, até que tive um conhecimento melhor sobre a vida académica. As praxes servem para te integrares na universidade, criares ligações com os/as futuros(as) padrinhos/madrinhas. Não podemos criticar algo que não tenhamos o conhecimento total.
É só a minha opinião, vale o que vale.

João Simas disse...

Há que ver se a praxe é mesmo uma tradição e onde e qual a função prática.
Houve alturas em que não havia praxes nas universidades mais antigas. Ainda hoje há algumas onde não existem, nem alguns dos rituais e trajes associados.
Será que as praxes têm alguma relação com o tipo de trabalho e avaliação que se fazem no ensino superior? Um aluno que tenha que ir apresentando trabalhos desde o princípio terá tempo para andar em praxes? Se as pessoas participarem noutras atividades associativas não vão integrar-se também? Refiro-me a atividades que tantos grupos ou associações de estudantes têm, como cinema, teatro, revistas, tertúlias, passeios, festas...

Unknown disse...

Concordo, professor, com o seu comentário e com o texto da Catarina. Na minha opinião, as praxes estão a ser generalizadas e, muitas vezes, levadas ao extremo. Pode ser considerado um meio de integração, mas depende das actividades que são praticadas nessa tal de praxe. Temos exemplos bem recentes do que as praxes podem levar a fazer. Para mim, só haveria um dia de praxe, ou de "brincadeira" e a integração deveria ser feita nessas actividades que o professor referiu, como os passeios, as tertúlias ou as festas. Acho que os alunos de 3ºano tomam, completamente, as redeas da Universidade e os mais novos, os ditos caloiros, não tem outro meio de escape senão ficar em casa. Na Universidade de Évora as praxes duram até 1 de Novembro, o que é um exagero tendo em conta as actividades que são realizadas. Tal como a Catarina referiu a altura das praxes modifica a vida na cidade e concordo quando ela afirma que os "senhores estudantes" também querem tomar, de certa forma, conta da cidade. Falo por experiência própria, pois já fui abordada na rua por alunos do ensino superior que me queriam praxar, julgando que eu era caloira.