sexta-feira, 24 de abril de 2015

Fundamentalismos





À data que redijo esta reflexão comemoramos, em Portugal, novamente a conquista da liberdade: a liberdade de pensar, de agir, de escolher e de viver. Precisamente por isso, não posso deixar de pensar nas ameaças que essa liberdade enfrenta atualmente. Se pensarmos em termos históricos, os Estados Totalitários são uma herança de ontem, pelo que, deveríamos ter a memória fresca daquela que foi e será sempre a maior catástrofe da humanidade: a falta de humanidade. Em Portugal ainda são vivas inúmeras pessoas que viveram o Antigo Regime.
Se nos pomos a pensar na quantidade de vidas que se extinguiram com o objetivo de conquistar esse conceito que, hoje tantas vezes, vimos ameaçado arranjamos uma dor de cabeça séria. E porquê? A minha geração tem a liberdade como um dado adquirido, alguém a conquistou para nós, como tal, nunca tivemos de pensar muito nela. Todavia, hoje escolho pensar naquela que é para mim uma das ameaças mais assustadoras e complexas dos dias de hoje: quando pessoas livres escolhem o caminho do fundamentalismo, da ditadura e da escravidão. Estou, portanto, a pensar em todos aqueles jovens europeus que abandonam a liberdade em nome de uma religião e de uma causa politica que não reconhece o direito ao mundo ocidental, isto é, à diferença de um modo de vida diferente, não reconhece direitos a crianças, a mulheres e a todo aquele que não pense exatamente como está definido que se deve pensar. Não quero considerar esta questão em termos de bons ou maus, antes sim à luz da complexidade que nos apresenta.
Hitler foi eleito democraticamente numa Alemanha em ruínas, Salazar num Portugal atrasado e debilitado. Fazendo o paralelismo, em que ruínas se apresenta o mundo ocidental que o único caminho que estes jovens reconhecem é o da guerra e do caos? Serão os responsáveis o desemprego, a falta de valores, a corrupção, a identidade em crise e a falência da educação europeia? Ou será este o preço a pagar por uma certa inconsciência ocidental a lidar com aquela zona do globo quando esta ainda não apresentava ameaças de maior? Ou será ainda uma conjunção de todas estas coisas? Certo é que a liberdade em que vivemos nos obriga a equacionar todas estas questões sobre pena de a perdermos. Parece um contra senso, a liberdade “obrigar-nos” a seja aquilo que for. No entanto, ser livre é ser obrigado a um pensamento constantemente vivo, constantemente reflexivo, constantemente crítico. O preço a pagar, sabemo-lo demasiado bem porque aconteceu, como já aqui disse, “ontem”.
 Assim, a nossa responsabilidade não pode ser abandonada com a desculpa de que é fruto da liberdade apenas escolher, ou seja, não podemos ver esta problemática sob a ótica do “é uma escolha deles não nossa”. Precisamente porque sabemos os perigos de determinadas escolhas é que temos a responsabilidade de pensar neste movimento tão atual quanto preocupante de adesão a grupos radicais e terroristas. Este é um desafio que temos todos de aceitar. Não estamos a falar de um mero confronto de culturas ou civilizações. Estamos sim a tentar compreender onde estamos a falhar. Estamos a tentar decidir que futuro teremos. Estamos a tentar evitar erros cometidos no passado e somos todos responsáveis por todos. Não basta ter medo de qual será o próximo ataque terrorista (onde e quando) ou qual será o próximo jovem a fugir para a Síria. É urgente ir ao fundo desta questão e tentar arranjar soluções para que não se repita a maior catástrofe que conhecemos ou poderemos conhecer: a falta de humanidade.

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