quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Verdadeiro Método de Estudar


Também se deve advertir aos Mestres que tenham mais empenho em serem amados e respeitados dos discípulos, do que temidos pelo castigo. Não é pequeno abuso neste país castigar os rapazes quando não sabem logo a lição, sem distinguir se provém de ignorância ou de malícia. Estes rigorosos castigos pela maior parte produzem tal aversão aos estudos, que não se pode vencer em todo o discurso da vida. Falar a alguns destes no estudo é falar-lhe na morte. Provém isto, primeiramente, da feia carranca com que pintam os estudos, mandando-lhe estudar uma quantidade de coisas sem saberem que serventia têm, e dando-lhe muita pancada, se as não repetem bem. Isto é uma crueldade, como já apontei a V. P. em outra carta. O Mestre deve explicar bem as matérias e facilitar os estudos; deve, além disso, obrigar os estudantes com maneiras agradáveis, e insinuar-se no seu ânimo. Não há coisa que não faça um homem, se lhe sabem inspirar a paixão própria. Muitos obram pelo interesse do prémio; outros, pela glória da doutrina e por um louvor dado em público. Estas são as armas de que deve servir-se o Mestre: deve procurar de ser amado e, no mesmo tempo, respeitado. O estudante que não é sensível à desonra de se ver repreendido publicamente, e outras coisas destas, não o será às palmatoadas. Além disso, se o estudante é muito rude, as palmatoadas não lhe dão juízo; se o não é, há outro modo de o regular.
Confesso a V. P. que, com grande gosto e admiração minha, vi muitas vezes moços bem desinquietos mudarem de vida, tomados com boa maneira, e somente com conversarem com alguma pessoa que insensivelmente lhe inspirava pensamentos heróicos. Em uma palavra, o castigo deve ser a última coisa, e bem raras vezes; e deve o Mestre entender que o procurar todas as outras vias não é somente obrigação leve, mas grave. Para isso é que os Pais lhe entregam os Filhos, e para isso é que a Providência o destinou àquele emprego: para que busque os meios próprios de conduzir os meninos ao fim de serem bons e estudarem bem.


Verney, O verdadeiro método de estudar, Valensa, 1766
Nota: Repare-se que Verney, um iluminista português, propõe métodos que dois séculos depois ainda não eram aplicados em muitas escolas.

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